Antes mesmo de seu início, o governo de Jucelino Kubitschek uma série de dificuldades. As adversidades políticas que marcaram o período entre sua indicação como candidato e sua posse como presidente não deixavam dúvidas quanto à ferrenha oposição que teria pela frente. O novo governo, fruto da aliança PSD-PTB, certamente seria hostilizado por adversários capitaneados pela UDN, para quem Juscelino e Jango representavam a continuação política do ex-presidente Getúlio Vargas . Parecia não existir possibilidade de meio termo para o novo presidente, e por isso mesmo o apoio da opinião pública seria a única forma de garantir sua manutenção no cargo. Era preciso ousar, e JK ousou ao anunciar seu programa de governo – 50 anos de progresso em 5 anos de realizações, com pleno respeito às instituições democráticas.
Esse ideal desenvolvimentista foi consolidado num conjunto de 30 objetivos a serem alcançados em diversos setores da economia, que se tornou conhecido como Programa ou Plano de Metas. Na última hora o plano incluiu mais uma meta, a 31a, chamada de meta-síntese: a construção de Brasília e a transferência da capital federal, o grande desafio de JK. Não se pode dizer que essa fosse a primeira experiência de Juscelino de governar com base num plano de desenvolvimento. Guardadas as devidas proporções, como governador de Minas Gerais de 1951 a 1955, JK já tinha eleito o binômio energia e transportes como metas de desenvolvimento para a sua gestão.
Tanto o plano de governo mineiro quanto o Plano de Metas de Juscelino foram elaborados com base em estudos e diagnósticos realizados desde o início da década de 1940 por diversas comissões e missões econômicas. O último grande esforço de diagnóstico dos entraves ao crescimento econômico brasileiro fora feito pela Comissão Mista Brasil-Estados Unidos entre 1951 e 1953, ainda no governo Vargas. Os estudos da Comissão Mista, assim como os do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE) e os da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (CEPAL), indicavam a necessidade de eliminar os "pontos de estrangulamento" da economia brasileira. Tratava-se de setores críticos que não permitiam um adequado funcionamento da economia. A premissa do Plano de Metas, esboçado pouco antes da posse de JK por uma equipe do BNDE, era, assim, a superação desses obstáculos estruturais. As metas deveriam ser definidas e implementadas em estreita harmonia entre si, para que os investimentos em determinados setores pudessem refletir-se positivamente na dinâmica de outros. O crescimento ocorreria em cadeia. A meta de mecanização da agricultura, por exemplo, indicava a necessidade de fabricação de tratores, prevista na meta da indústria automobilística.
Para os analistas da época, o Brasil vinha passando, desde a década de 1930, por um processo de substituição de importações não-planejado, e a falta de planejamento seria a causa dos constantes desequilíbrios no balanço de pagamentos. O Plano de Metas pretendia suprir essa falta. A introdução de uma meta de consolidação da indústria automobilística no país tinha como objetivo, entre outras coisas, a redução planejada e gradativa da importação de veículos.
Talvez pela consciência que tivesse das dificuldades inerentes à burocracia estatal e dos obstáculos permanentes e inevitáveis impostos pela oposição, JK traçou uma estratégia de ação que se mostraria acertada com relação à administração e à operacionalização do Plano de Metas. Já na primeira reunião de seu ministério, em 1o de fevereiro de 1956, criou um órgão diretamente subordinado à Presidência da República, o Conselho do Desenvolvimento, que iria coordenar o detalhamento e a execução do plano. Tendo como secretário-executivo o presidente do BNDE, e reunindo todos os ministros, os chefes dos gabinetes civil e militar e o presidente do Banco do Brasil, o conselho constituiria uma administração paralela com autonomia de decisão suficiente para viabilizar a realização dos projetos. O conselho foi conduzido, primeiramente, por Lucas Lopes. Quando este deixou a presidência do BNDE para assumir o Ministério de Fazenda, em agosto de 1958, seu lugar foi ocupado por Roberto Campos, que permaneceu até julho de 1959. Dessa data até o final do governo, Lúcio Meira presidiu o BNDE e foi o secretário-executivo do conselho.
O Conselho do Desenvolvimento recorria a especialistas dos diversos setores previstos no Plano de Metas e também a economistas oriundos de órgãos do governo, como a Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc). Atuava através de grupos executivos, aos quais cabia a responsabilidade pela concessão de incentivos ao setor privado para que as metas de que tratavam fossem atingidas. O mais conhecido de todos foi o Grupo Executivo da Indústria Automobilística (GEIA). A coordenação dos investimentos do setor público era atribuição do BNDE.
O Plano de Metas mencionava cinco setores básicos da economia, abrangendo várias metas cada um, para os quais os investimentos públicos e privados deveriam ser canalizados. Os setores que mais recursos receberam foram energia, transportes e indústrias de base, num total de 93% dos recursos alocados. Esse percentual demonstra por si só que os outros dois setores incluídos no plano, alimentação e educação, não mereceram o mesmo tratamento dos primeiros. A construção de Brasília não integrava nenhum dos cinco setores.
As metas eram audaciosas e, em sua maioria, alcançaram resultados considerados positivos. O crescimento das indústrias de base, fundamentais ao processo de industrialização, foi de praticamente 100% no qüinqüênio 1956-1961.
Ao final dos anos JK, o Brasil havia mudado. Muitos foram os avanços, e muitas foram as críticas à opção de JK pelo crescimento econômico com recurso ao capital estrangeiro, em detrimento de uma política de estabilidade monetária. O crescimento econômico e a manutenção da estabilidade política, apesar do aumento da inflação e das conseqüências daí advindas, deram ao povo brasileiro o sentimento de que o subdesenvolvimento não deveria ser uma condição imutável. Era possível mudar, e o Brasil havia começado a fazê-lo.
Suely Braga da Silva
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