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Marxismo, Doutrina Social da Igreja, Anarquismo - História do movimento operário. #doutrinasocialdaigreja

 

Na literatura e na academia, importantes escritores se debruçariam sobre a realidade social da classe operária. Como exemplo poderíamos citar Oliver Twist, de Charles Dickens, que contava a história de um menino órfão, que sofre as agruras da sociedade industrial inglesa do século XIX. No Brasil, inclusive, em 1870, Machado de Assis iniciou sua tradução. O sucesso do livro nos mostra que a situação social não era despercebida pela sociedade. Mas a questão da organização e condição do trabalho não ficaria apenas na produção literária de ficção, pensadores escreveriam também sobre o tema tentando encontrar ou propor formas alternativas de produção e relação com a mão de obra. Uma série desses intelectuais seria mais tarde classificada como socialistas utópicos. Entre os principais eu destacaria Pierre Proudhon e Robert Owen.

Embora as críticas às desigualdades impostas pela propriedade privada tenham feito parte de uma das obras mais lidas no século anterior, a do escritor e fenômeno literário do século XVIII, J.J. Rousseau, além de ter produzido um movimento radical, em plena revolução francesa, a Conjuração do iguais, de Babeuff, é na primeira metade do século XIX que o conceito moderno de socialismo passaria a fazer parte do vocabulário dos críticos sociais. Aquele grupo, formado pela maioria da população das sociedades modernas, que ajudou as burguesias nacionais a promoverem sua ascensão social, nas cidades industriais, ganham nomenclaturas específicas. As principais, operário e Proletariado.

No primeiro caso, trata-se de uma palavra de origem latina e que significa “aquele que produz”, mais do que produtos industriais, para Adam Smith, é esse trabalhador, ou o seu trabalho, o responsável pela produção da riqueza. A partir desse momento, o termo operário estaria cada vez mais vinculado a um tipo específico de trabalhador, o trabalhador das fábricas, o trabalhador urbano, o trabalhador, para usar um conceito da Geografia, o trabalhador do segundo setor. Já a segunda nomenclatura, proletariado, tem origem na antiguidade romana, e seu significado estaria ligado a condição de pobreza em que vivia determinado cidadão. Em uma sociedade na qual o exército se constituía em garantia de manutenção da soberania de um império, a único produto de alguma importância que esse cidadão desprovido de riqueza poderia fornecer para o Estado seria seus filhos, sua prole, por isso proletariado. Nas sociedades industriais, proletariado seriam todos os que não eram detentores de meios de produção, e, consequentemente, precisavam oferecer sua força de trabalho no mercado de trabalho aos detentores desses meios de produção.

Nesse momento, um conceito já conhecido desde a baixa idade média, também passa por uma ressignificação, o termo Burguesia. Se até meados do século XVIII, a palavra burguesia estava associada ao comércio, a partir das sociedades industriais essa palavra ganha um novo significado, passando a se referir a todos os que possuem os meios de produção. Em suma. Nessa concepção, a sociedade estaria dividida em apenas dois grupos, a burguesia e o proletariado. Com base nesses conceitos, variando ao longo da História entre propostas relativamente mais conciliatórias, como a social democracia,  e o conflito, orientado pela chamada luta de classes. A inexistência de organização desses trabalhadores era, muitas vezes, resultado de leis que as proibiam. Na Inglaterra, principal centro da industrialização, em 1824, foi publicado uma lei autorizando a associação de trabalhadores. Essas associações eram conhecidas como Trade Unions. Entre os movimentos de trabalhadores desse período são normalmente destacados o movimento ludista, mais conhecido como os quebradores de máquinas e o movimento cartista. O primeiro, mais radical, acreditava que as máquinas eram responsáveis pela desvalorização do trabalho e do trabalhador, resultando na degradação das condições de trabalho. Nesse sentido promoviam ataques a fábricas e a quebra de máquinas. A ação vigorosa do governo inglês, tanto com tropas, quanto com leis, acabou enfraquecendo e dissolvendo o movimento. Já o Cartismo consistiu no envio de petições ao parlamento britânico com demandas acerca, principalmente de direitos políticos. Esses trades unions dariam origem, a partir da segunda metade do século XIX, aos sindicatos de trabalhadores, que, assim como os trade unions, representavam os anseios de trabalhadores por melhores condições de trabalhos e melhores salários. Para vocês terem uma noção, no período dos trade unions, os trabalhadores não votavam, não que sua condição específica de trabalhador não permitisse, mas a sua renda, já que esse fator era determinante para que o cidadão tivesse direito político. Quando consagrou-se o sufrágio universal, sua vontade era ceceadas pelos interesses dos patrões, já que o voto era aberto, era público e todos podiam saber em quem você votou, logo votar publicamente em um candidato oposto ao indicado pelo patrão, poderia resultar em consequências desagradáveis.

 Enquanto os trade unions tentavam melhorar a situação dos trabalhadores de forma objetiva, concreta, no dia a dia, pensadores discutiam teoricamente, organizações alternativas para as sociedades industriais. Entre eles podemos destacar Henri de Saint-Simon, Charles Fourier, Louis Blanc. Alguns, como Robert Owen, como administradores de grandes empresas chegam a implantar modelos que considerem a s condições do trabalhador, tais como educação para os filhos de empregados, jornada de trabalho de dez horas, quando o padrão era trabalhar dezesseis ou mais. O nosso querido Owen chegou a fundar uma empresa nos EUA, a New  Harmony. Tanto sua experiência nos Estados Unidos quanto na Europa não foram bem sucedidas. Entre esses teóricos, o de teoria mais radical era Proudhon. Essa primeira safra de socialistas acabou sendo mais tarde estigmatizada como socialistas utópicos, pois, segundo seus críticos e sucessores, eram inocentes ao acreditar que o próprio sistema econômico iria se convencer que a exploração sem medidas era anti-produtiva.

Em 1848, a Europa era varrida por uma revolução, que já estudamos em nossa aula de revoluções liberais, era a Primavera dos Povos. Foi nesse momento que o filósofo alemão, Karl Marx, produtor de uma das mais volumosas e densas obras do século XIX, foi convidado para escrever um texto que pudesse reunir e dar um propósito aos trabalhadores europeus. Não podia ser um texto grande nem de difícil compreensão. Tinha que ser acessível ao mais simples dos operários das fábricas. E acabou sendo mesmo. Eu diria que, se comparado a densidade de sua obra, esse texto parece mais um gibi, e não por acaso tornou-se o mais popular, o mais conhecido, já tendo sido publicado, inclusive como história em quadrinhos. Sabe qual texto foi esse? O manifesto comunista.

Em termos metodológicos, o pensamento de Marx é orientado pelo chamado Materialismo Histórico, que pode ser compreendido como uma inversão, talvez uma adaptação mesmo, do idealismo de Hegel, e aqui eu chamo sua atenção para não confundir Hegel com Engels, que acabou sendo o principal parceiro na produção do chamado velho Marx. Como dizia, o idealismo de Hegel, principalmente o princípio da dialética, seria apreendido por Marx, mas adaptado para o mundo da matéria. Para Hegel, o que move o mundo são as ideias e esse movimento das ideias é resultado do conflito entre ideias diferentes, contrárias. Esse movimento é resultado do embate tese versus antítese que se desdobra na síntese, nada mais nada menos do que uma nova ideia. Lembra de suas aulas de filosofia? Então, Marx também considera a dialética, mas ao invés da contradição entre ideias, o que move a história é o conflito no mundo material, logo, o conflito é entre matérias. Desse modo, a luta de classes seria para Marx o motor da História dos homens. Por isso seu modelo é conhecido tanto como materialismo histórico quanto como materialismo dialético. O  marxismo era crítico ao nacionalismo, pois considerava que o mundo só possui dois grupos, os dos explorados e dos exploradores, por isso, ao terminar em seu texto de 1848, ele termina com a seguinte expressão: Trabalhadores do mundo, uni-vos. Nessa linha é organizada a chamada associação internacional dos trabalhadores, integrada por organizações operárias de diversos países europeus. A repressão e as crescentes divergências internas enfraqueceram a organização, que acabou sendo extinta em 1876. Essas divergências internas eram resultado da radicalização de alguns grupos que que divergiam, por exemplo, da participação do estado na constituição de uma sociedade comunista. Pensadores como Bakumin afirmavam que o Estado é sempre opressor, logo as instituições deveriam ser eliminadas. É nesse contexto que ganhava força o anarquismo, vertente que durante os próximos anos ganharia influência na organização dos sindicatos, naquilo que ficaria conhecido como anarco-sindicalismo.

Enquanto tudo isso acontecia, a Igreja enfrentava uma crescente perda de poder político. Lembram da Unificação Italiana, que estudamos em um de nossos textos anteriores? Algumas aulas atrás? Então é nesse contexto que a Igreja começa a demonstrar preocupação com a questão social. Alguns padres da Igreja já escreviam sobre questões correlatas, mas seria em 1891, que a alta cúpula da Igreja se manifestaria oficialmente sobre a temática.  A comunicação não veio por meio de um simples comunicado, mas por intermédio de uma encíclica,  a Encíclica Rerum Novarum. Com essa encíclica, o Papa Leão XIII faz duras críticas em relação ao que ele percebia como agravamento das condições dos trabalhadores mundiais na esteira do desenvolvimento da economia mundial. Embora a Igreja percebesse essa situação, o Papa deixava claro, de forma enfática, sua desaprovação às propostas apresentadas pelos diferentes movimentos socialistas, defendendo firmemente o direito à propriedade privada, salientando, no entanto, a necessidade de uma melhor distribuição da riqueza. Se dirige aos empresários cristãos, conclamando-os a fazer valer os seus espíritos cristãos. Leão XVIII não excluía os Estados de sua crítica, pois afirmava a necessidade de os Estados criarem associações de proteção aos trabalhadores, intervindo nas relações entre empregados e empregadores para viabilizar as melhorias das condições as quais homens, mulheres e crianças estavam sendo submetidas.

Ficamos por aqui, No encontramos nos nossos próximos textos.

Grande abraço,

Professor Arão Alves – História em Gotas Academy

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