By: Joseph E. Harris com a colaboração de Slimane Zeghidour
“No século XX e, sobretudo, após
a Primeira Guerra Mundial, durante as negociações do Tratado de Versalhes e a
formação da Sociedade das Nações, foram os negros americanos quem defenderam
energicamente os direitos dos negros africanos, pois, nesta época, nós não
estávamos em condições de falar em nosso próprio nome.” “Não esqueçamos jamais
que eles são dos nossos [os negros da diáspora]. Estes filhos e filhas da
África, arrancados de nossas margens, não esqueceram os laços que os unem à
terra dos seus ancestrais [...]. Eles combatiam pela igualdade das nações e
raças na África, bem anteriormente a que muitos entre nós tenham sequer tomado
consciência do nosso rebaixamento [...]. Agora que nós, africanos, conquistamos
a nossa independência, eles deveriam poder encontrar um poderoso amparo para
alcançar o pleno reconhecimento dos seus direitos e da sua dignidade como
cidadãos de seu país.” “O maior serviço que vós podeis prestar ao vosso país
seria de persuadir os milhares de negros, dos Estados Unidos da América do
Norte e das Antilhas, a virem trabalhar conosco pelo desenvolvimento da Etiópia.
Estas citações mostram claramente que a dinâmica das relações históricas entre
a África continental e as suas diásporas, estudada nos volumes anteriores, prosseguiu
após 1935. Estas relações, sobreviventes aos tráficos escravistas em direção à
Ásia, Europa e Américas, foram consolidadas pelas experiências psicológicas e
sociais da diáspora, de onde nasceram os movimentos de protesto, as revoltas e
as ações internacionais conduzidas em prol da libertação dos negros, da
liberdade e igualdade dos africanos e dos seus descendentes, no continente e no
estrangeiro. Igualmente, a natureza, a maior ou menor crueldade da escravatura,
o número de escravos e a sua proporção em relação aos senhores, influenciaram
profundamente o processo de socialização e assim contribuíram, para modelar a
representação da África, própria às diferentes comunidades da diáspora. Do
mesmo modo, à imagem da maneira variável através da qual os
africanos do continente se fazem
representar, os pertencentes à diáspora têm a sua atuação em função da sua
experiência de colonização. Na África como no exterior, os europeus, os
americanos e os asiáticos depreciaram a raça negra e desestimularam a expressão
de uma solidariedade internacional entre os negros. Entretanto, a ideia de um
“salvamento” da África, a provocar a emancipação dos negros e demonstrar a sua
capacidade, tanto em se autogovernar, quanto em contribuírem para a civilização
mundial, impôs‑se fortemente na diáspora e provocou o nascimento dos
movimentos negros internacionais de libertação. Como
exposto no capítulo 29 do volume
VII, estas tentativas de libertação processadas na África e na diáspora
culminaram, entre 1900 e 1935, no movimento pan‑africanista;
os anos 1920, particularmente, conheceram uma intensa atividade, especialmente,
graças aos esforços de Marcus Garvey e W. E. B. Du Bois, nos Estados Unidos da
América do Norte, e àqueles dos estudantes africanos, na França e na Grã‑Bretanha.
Vejamos, neste momento, os fatos que se passaram na diáspora africana após
1935. Primeiramente, os africanos continuaram a emigrar em direção à Europa, Ásia
e ao Novo Mundo, contudo, as suas motivações, o seu número e o seu destino eram,
desde então, sensivelmente diferentes. Aproximadamente, até o final do século
XIX, o tráfico praticado através do Mediterrâneo, do Oceano Índico e,
principalmente, do Atlântico, foi evidentemente o motivo essencial da emigração
africana. No século XX, notadamente entre 1935 e 1960, o sistema colonial constituiu
a principal razão da emigração. Crescente número de africanos, impelidos pelo
desejo de escaparem à opressão econômica e política, emigrou para as capitais
europeias. Eles vêm principalmente das colônias francesas da
África do Norte e das colônias
belgas; milhares de argelinos estabeleceram‑se especialmente na
França durante este período: no curso da guerra da Argélia, havia na França
cerca de 450.000 argelinos e pouquíssimos retornaram à sua terra natal4. A
necessidade de formação superior explica, igualmente, boa parte das emigrações
africanas, quase todas as potências coloniais desinteressaram‑se pelo
ensino universitário na África. O número de estudantes africanos inscritos nas
universidades europeias e americanas cresce de modo intenso, entre 1935 e 1960,
e muitos dentre eles não mais retornam ao seu país de origem. Durante este
período, a emigração africana para a América do Sul, Caribe e Índia cessa quase
inteiramente, os emigrantes dirigiam‑se, em sua grande maioria e desta feita,
para a Europa e para os Estados Unidos da América do Norte, em uma proporção
muito superior àquela dos dois séculos precedentes. Em que pese a ausência de
estatísticas, pode‑se afirmar com certeza que o número de africanos a terem
deixado naquele momento o seu continente fora relativamente limitado, uma vez
que se tratava principalmente de estudantes. Após as independências, a partir
dos anos 1960, a emigração prosseguiu, porém, a sua natureza, as suas
motivações e o destino dos emigrantes foram, novamente, modificados. Não é mais
os estudantes que se expatriam, mas, igualmente, técnicos e especialistas
altamente qualificados: médicos, engenheiros, homens de negócios, músicos e
outros artistas, professores universitários, etc. Por outro lado, durante este
período, a emigração conduz novamente os africanos a toda parte do mundo, como
anteriormente ao século XX, pois que, eles não somente se estabelecem na Europa
Ocidental e nos Estados Unidos da América do Norte mas, igualmente, no Oriente
Médio, nos antigos países socialistas, no Canadá, na Austrália e no Pacífico
Sul. Professores e conferencistas africanos oferecem cursos na Universidade da
Papuásia ‑Nova Guiné! Este fenômeno, a “fuga dos cérebros”, tomou
proporções realmente alarmantes nos anos 1960 e 1970, entretanto e felizmente,
parece ter chegado à sua solução. Nesta mesma época, não mais causa espanto
encontrar africanos médicos, dentistas, cientistas, engenheiros, professores,
etc., no estrangeiro. Se a África está privada das suas competências, estas ao
menos testemunham o seu êxito nos planos intelectual, cultural e político. A
emigração das mulheres confere uma nova característica à emigração africana. Instruídas
ou semialfabetizadas, diplomadas ou não, frequentemente oriundas da costa
ocidental, estas africanas emigraram para Europa (especialmente para a França,
Alemanha ou Grã‑Bretanha) e para as Américas na esperança de lá
encontrarem um emprego (muitos são enfermeiras) ou enriquecerem‑se
(aqui incluído o contrabando ou tráfico de entorpecentes). Uma emigração
masculina do mesmo tipo constituiu a terceira característica da diáspora
moderna: uma crescente quantidade de africanos pouco instruídos, sem formação,
esperam ganhar a sua vida nas grandes metrópoles europeias, por intermédio de
variados tipos de atividades, lícitas ou não, a começar pelo “lavar a louça” em
restaurantes, passando pelos trabalhos de manutenção, até, finalmente e
inclusive, o contrabando ou o tráfico de drogas. Uma última categoria de
emigrantes, recentemente evidenciada, vem inchar as fileiras da nova diáspora,
temporária ou definitivamente. Trata‑se dos exilados políticos. Eles
fugiram da guerra civil ou foram vítimas dos conflitos fronteiriços entre
países independentes; foram os instigadores ou organizadores de um golpe de
Estado fracassado ou foram expulsos do seu país por espionagem em benefício de
uma potência estrangeira ou por outras razões. Assim sendo, em
1986, Gana privou oito dos seus
cidadãos, acusados de espionagem em favor dos Estados Unidos da América do
Norte, da sua cidadania e os trocou por um agente dos serviços de segurança
ganês que trabalhava nos Estados Unidos. Pode‑se, a partir do supra‑exposto,
facilmente deduzir que as razões, antigas ou novas e em virtude das quais os
africanos emigraram, têm a sua origem, inicialmente, na progressiva degradação
da situação socioeconômica e política desde as independências (degradação
examinada em outros capítulos do presente volume). Os africanos emigraram para
encontrar empregos ou maior realização profissional, para rapidamente
enriquecer ou para conhecer a aventura. Os africanos da diáspora desde 1935 Qual
contribuição os africanos dos diferentes países da diáspora teriam trazido ao
pan‑africanismo,
desde os anos 1930? O movimento pan‑africanista conheceu uma nítida
inflexão em suas atividades na América e na Europa após a realização do
Congresso Pan‑Africano de Nova Iorque, no ano 1927. Contudo nos anos
1930, ele reagiu vigorosamente à agressão da Itália contra a Etiópia (1935‑1941)
e à ascensão do fascismo na Europa. Esta reação manifesta, especialmente na
Europa e na América, conduziu a um aprofundamento da doutrina e a uma ampliação
das atividades, as quais se expressariam durante o Congresso Pan‑Africano
de Manchester, em 1945, e contribuiriam para a derrubada do sistema colonial e
para a conquista das independências, nos anos 1950 e 1960. A agressão contra a
Etiópia colocou em espetacular evidência a dependência da África em relação à
Europa, assim como a hesitação e a ineficácia das grandes potências quando elas
deveriam, isoladas ou sob a égide da Sociedade das Nações, tornar respeitáveis
a liberdade e a justiça. Na Inglaterra, C. L. R. James e outros fundaram, em
1936, a International African Friends of Ethiopia (IAFE). Esta associação,
através das suas conferências, suas petições e suas manifestações, ganhou o
apoio da opinião pública à causa da Etiópia. Uma organização amplamente
implantada e muito combatente, o International African Service Bureau (IASB),
criado em 1937, soube eficazmente associar os problemas locais à crise etíope.
Com o objetivo de apoiar os negros da Grã‑Bretanha, nos campos econômico
e político, bem como no tocante à educação, o IASB, amplamente popular graças
ao seu jornal, o International African Opinion, esforçava‑se em cooperar
com associações americanas. Uma das grandes figuras deste movimento pan‑africano
na Grã‑Bretanha foi o guianês George Thomas Nathaniel Griffith,
mais conhecido sob o nome RasMakonnen. Ele estudara nos Estados Unidos da
América do Norte, onde fizera muitos amigos entre os negros, exercendo profunda
influência, embora muitas vezes discreta, sobre os negros da Grã‑Bretanha.
Através do seu trabalho, conseguiu economizar fundos e abrir diversos
restaurantes e clubes em Manchester, os quais serviam à causa dos trabalhadores
e negros. Ele possuía estabelecimentos como o Ethiopian Teashop, o
Cosmopolitan, o Forum Club, a Belle Étoile, nos quais os clientes negros, por
vezes futuros dirigentes africanos ou antilhanos, vinham debater problemas
atuais, e onde estudantes negros podiam trabalhar para pagarem seus estudos. Makonnen,
juntamente com o Dr. Peter Milliard, seu compatriota, o queniano Jomo Kenyatta
e o antilhano George Padmore, criara a Pan‑African Publishing
Company, responsável pela publicação mensal do Pan‑Africa.
Ele também possuía uma livraria, a Economist7. Esta rede de empresas devia
facilitar a realização da reunião de nacionalistas negros, a mais bem‑sucedida
de todas aquelas ocorridas antes da era da independência. Ao grupo formado ao
redor de Ras Makonnen agregaram‑se o sul‑africano
Peter Abrahams, o serra‑leonês Wallace‑Johnson
e C. L. R. James, posteriormente juntou‑se Kwame Nkrumah. Estes
militantes fundaram, no ano de 1944, a Federação Pan‑africana,
organizadora do memorável quinto Congresso Pan‑Africano,
realizado em Manchester, no ano 1945. Nos Estados Unidos da América do Norte,
sob a direção de William Leo Hansberry, negros vindos da África ou provenientes
da diáspora fundaram, em 1934, o Ethiopian Research Council (ERC), com o
objetivo de tornar conhecida a situação da Etiópia e contribuir com a formação
de uma rede internacional de negros engajados em expandirem a causa africana.
Os fundadores do ERC — William Leo Hansberry, Ralph Bunche e William Steen,
cidadãos norte‑americanos, o ugandense Hosea Nyabongo e o etíope Malaku
Bayen — sabiam que a Etiópia exercia uma considerável atração sobre as
populações africanas e que a consciência da herança etíope inspirara uma
ideologia de libertação que representava uma poderosa e recorrente afirmação da
identidade e da solidariedade africanas no continente e na diáspora. Os poucos
professores e estudantes da Universidade Howard oriundos do ERC possuíam
contatos em diversas cidades dos Estados Unidos da América do Norte, na
Etiópia, Grã‑Bretanha, França, Itália e nas Antilhas. O ERC
desempenhava um importante papel como escritório‑central
de informação sobre a Etiópia e facilitava ou organizava as atividades
conduzidas em favor deste país. Quando os italianos invadiram a Etiópia,
numerosos afro‑americanos pretenderam unir‑se à
armada etíope, entretanto, o governo dos Estados Unidos
da América do Norte declarou‑se
neutro e interditou aos cidadãos americanos tomar partido em relação à guerra.
Apesar disso, dois pilotos afro‑americanos, Hubert Julian e John
Robinson, encorajados pelo ERC, foram à guerra na Etiópia. Robinson tornou‑se
o piloto particular do imperador e foi nomeado conselheiro para a aviação.
Apelidado Condor Marrom, ele efetuou várias missões aéreas para a Etiópia, no
curso de uma das quais o seu avião foi abatido. O apoio moral e a ajuda material
dos africanos da diáspora foram mais importantes que a sua ajuda militar. Os
negros da diáspora como aqueles das colônias africanas, organizaram
manifestações e multiplicaram os artigos e os clamores em favor da Etiópia.
Entre as organizações pró‑etíopes criadas nos Estados Unidos da
América do Norte, devemos citar os Friends of Ethiopia (FOA), fundada por um
professor afro‑americano, Villis Huggins, quem fora à Europa e obtivera o
aval dos embaixadores etíopes em Londres e Paris. Em menos de um ano, a FOA
abriu escritórios em 106 cidades, distribuídas em 19 Estados norte‑americanos.
Ela organizou coletas de fundos em conjunto com o International African Friends
de Londres. É preciso igualmente assinalar a contribuição do Medical Committee
for the Defense of Ethiopia, formado por um grupo de médicos negros originários
das Antilhas e dos Estados Unidos da América do Norte, a trabalho em Nova Iorque.
Este comitê fretou um ou dois navios carregados de produtos médicos destinados
aos combatentes etíopes. Outros grupos − nos EUA, na Jamaica, em Trinidad e
Tobago, no Panamá, em Barbados, em Sainte‑Lucie e alhures −
distribuíam material de
propaganda em favor da Etiópia, organizavam concentrações, afirmando a sua
solidariedade vis‑à‑vis dos etíopes. Esta solidariedade expressou‑se
naturalmente com força particular junto aos rastafáris, os quais haviam
endeusado o imperador Haïlé Sélassié e extraído o seu nome de um antigo título,
rãs Tafari. O apoio dos africanos da diáspora continuou a se manifestar mesmo
quando o imperador foi obrigado ao exílio. As coletas de fundos prosseguiram e
os afro‑americanos engajaram‑se, ao menos em uma
ocasião, em negociações em caráter privado. Uma delegação foi a Londres e,
malgrado as objeções do Departamento de Estado norte‑americano,
persuadiu o imperador a enviar um emissário aos Estados Unidos da América do
Norte, intuindo promover a causa etíope naquele país. Foi assim que Malaku
Bayen, diplomado em 1935 pela Escola de Medicina da Universidade Howard e
cofundador do ERC, chegou à Nova Iorque, em 1936, na qualidade de enviado do
imperador para o continente americano. Bayen e a sua esposa, afro‑americana,
receberam uma boa acolhida dos afro‑americanos e de alguns brancos.
Algumas grandes manifestações permitiram arrecadar fundos, mas o principal
resultado da visita de Bayen aos EUA foi a fundação da Ethiopian World
Federation (EWF), em 1937. Bayen declarou publicamente: “Nós vamos criar os
Estados Unidos da África”, ele acreditava que a EWF insuflaria nos negros do
mundo inteiro o orgulho da raça. Em 1940, ele elogiou Marcus Garvey,
relembrando que a sua Universal Negro Improvement Association abrira espaço
para a EWF12.
Tal como Garvey, os Bayen
fundaram uma publicação oficial, The Voice of Ethiopia, “jornal da vasta
comunidade universal dos negros e amigos da Etiópia, espalhados mundo afora”.
Este jornal desempenhou um papel primordial no processo de redefinição da
africanidade, opondo-se especialmente ao emprego da palavra inglesa negro, considerada
um insulto e um meio para a divisão dos negros. “Nós não somos mais negros da
Antilhas ou americanos mas, verdadeiros etíopes”. “Negros da América, a Etiópia
vos pertence”. A palavra “preto” (black)
adquiriu grande popularidade:
“Pretos, uni‑vos”, “Nem mesmo um preto derramará o seu sangue pela
Europa enquanto a Etiópia não for libertada”, estes slogans e alguns outros
popularizaram‑se junto ao público graças ao The Voice of Ethiopia. O The
Voice of Ethiopia publicou artigos assinados por George Padmore, Nnamdi Azikiwe,
W. E. B. Du Bois, J. A. Rogers ou Akiki Nyabongo. Encontrava‑se frequentemente
nestes textos temas da história dos negros, assim como artigos sobre
personalidades negras, tais como o haitiano Toussaint Louverture, o imperador da
Etiópia Ménélik, o pastor e educador originário da Costa do Ouro (atual Gana)
James Aggrey, o americano Richard Wright, entre muitos outros. A presença de
seções da EWF em todos os Estados Unidos da América e em todos os países do
Caribe proporciona uma ideia da amplitude da sua influência. No dia 23 de julho
de 1939, na Jamaica, uma reunião organizada para apresentar a Carta da
Federação, reuniu cerca de 800 pessoas e teve como principal orador Amy Garvey.
Reuniões do mesmo gênero foram organizadas em novembro de 1939, na capital de
Cuba, Havana, e em Tela, Honduras. Em todas as ocasiões os oradores elogiaram a
obra de Garvey. Uma crônica do The Voice of Ethiopia, intitulada “novidades da
comunidade negra”, oferece uma imagem da influência exercida por este jornal e
pela EWF. Neste periódico publicam‑se informações e correspondências
provenientes, especialmente, do Egito, da Etiópia, do Sudão, do Panamá, da
Jamaica, de Honduras, da Venezuela e da Nigéria. Os artigos do The Voice of
Ethiopia eram replicados pelo The Comet (Nigéria), pelo Boston Chronicle (EUA),
pela Panama Tribune (Panamá), pela Union Messenger (Saint‑Christophe)
e pelo The People (Trinidad). Donativos em dinheiro destinados a ajudarem a
Etiópia foram enviados da Guiana britânica, de Bocas Del Toro e de Gamboa
(Panamá), da ilha de San Andrés (Colômbia), de Westmoreland (Jamaica), de
Maracaibo e de Longunillas (Venezuela). Quando Haïlé Sélassié retomou o seu
trono, em 1941, o governo etíope patrocinou a criação da primeira escola mista
do país, fundada por Mignon Ford antilhano de Barbados emigrado dos Estados
Unidos em 1930. Os médicos, pilotos, professores e outros afro‑americanos
vindos à Etiópia após a agressão italiana retornaram aos Estados Unidos,
entretanto, graças a William Leo Hansberry, muitos afro‑americanos
puderam dirigir‑se à Etiópia para trabalharem como professores ou
jornalistas. Outros negros, originários de Barbados, da Guiné, de Porto Rico e
dos Estados Unidos da América do Norte, foram empregados como pilotos ou
mecânicos. A invasão da Etiópia pelos italianos igualmente suscitou, em 1937, a
criação do International Committee on África, transformado em 1941 no Council on
Africa Affairs16. O seu fundador, o afro‑americano Max Yergan,
cumprira durante vinte anos as funções de secretário da Young Men’s Christian
Association (YMCA), na África Oriental e Austral. Ele foi certamente
influenciado pelas suas relações com o Congresso Nacional Africano (CNA) e com
o Sindicato Sul‑Africano dos Trabalhadores da Indústria e do Comércio.
Portanto e desde algum tempo empenhado em “ajudar a África”, Yergan persuadiu
certo número de negros (e de brancos progressistas) a fundarem consigo este
Conselho de Assuntos Africanos. O famoso cantor Paul Robeson e outro antigo empregado
da YMCA, William Alphaeus Hunton foram, juntamente com Yergan, os principais
dirigentes da organização financiada por ricos brancos progressistas. Yergan,
Hunton e Robeson aderiam ao marxismo e mantinham boas relações com o Partido
Comunista Americano sem, ao que tudo indica, serem membros da organização. As
suas ideias políticas lhes valeram ataques públicos no Conselho. Entretanto, no
contexto da época, a diretriz política dominante visava opor uma “frente única”
ao fascismo, o que implicava na colaboração com os comunistas, foi justamente
com este espírito que numerosos intelectuais, sindicalistas e muitos outros
aceitavam esta cooperação. Os negros não formavam, portanto, uma exceção. O
Conselho buscava promover a libertação dos africanos e melhorar a sua posição
social e econômica; com este objetivo, ele dedicava‑se a
difundir informações, facilitar a formação dos africanos na Europa e na
América, organizar intercâmbios, favorecer a cooperação entre os africanos. Assim
sendo, ele organizou
um encontro político com D. T. T.
Jabavu e A. B. Xuma, dois sul‑africanos que haviam estudado nos
Estados Unidos e dirigiam a All‑African National Convention (AANC),
organização fundada em 1935, em defesa dos direitos dos negros sul‑africanos.
Após 1941, o Conselho engajou‑se ainda mais ativamente em favor da
África e da descolonização em geral. Seções foram criadas em muitas cidades dos
Estados Unidos da América do Norte; uma dentre elas contou em meio aos seus aderentes
com Rosebery T. Bokwe, médico sul‑africano igualmente membro do CNA. O
Conselho endereçou cartas e petições aos governos dos Estados Unidos da América
do Norte e dos países da Europa, assim como a organizações internacionais. Ele
encorajou os sindicatos e os movimentos nacionalistas africanos. A interdição,
no Quênia, na África do Sul e no Congo belga, da usa publicação New Africa dá
uma noção sobre a sua influência. Precursores, em razão disso, do grupo de
pressão pró‑africano existente até os dias atuais nos Estados Unidos
da América do Norte, vários membros do Conselho encontraram, em 1944,
representantes da Divisão da África, pouco anteriormente criada no seio do
Departamento de Estado americano, e recomendaram a adoção de uma política
favorável à África. Este encontro parece ter se desdobrado na ulterior
assessoria, junto ao governo, provinda de alguns negros especialistas na
questão africana. Ao longo da primeira Conferência das Nações Unidas reunida em
São Francisco, no ano de 1945, Yergan e Eslanda Robeson exigiram uma melhoria
na situação econômica, política e social dos africanos. O Conselho solicitou
expressamente que os territórios sob mandato e todas as possessões africanas da
Espanha, de Portugal e da Itália, excetuando‑se a Eritreia, fossem
colocadas sob a tutela das Nações Unidas e que à África do
Sul lhe fosse interditada a
representação como membro do Conselho de Tutela. Após a Segunda Guerra Mundial,
as declarações do Conselho expressaram uma crescente oposição à política
americana. Esta postura explica‑se, em parte, pela Guerra Fria, a
qual colocava o Leste e o Oeste um contra o outro mas, igualmente, em razão do
acelerado desenvolvimento dos movimentos de libertação na África e na diáspora.
O Conselho preocupava‑se, particularmente, com a África do
Sul, não somente porque Yergan lá vivera, mas em função da
crescente repressão exercida
naquele país contra os negros, sobretudo a partir dos anos 1940. Em suplemento,
a fome que se abatia naquela região agravava sobremaneira a situação. O
Conselho criou um Comitê de Ajuda às vítimas da fome na África do Sul, enviando
dinheiro e alimentos às populações atingidas. A anexação do Sudoeste africano
(atual Namíbia), pela África do Sul, provocou vigorosos protestos. Um dos panfletos
publicados sobre esta questão pelo Conselho foi redigido por I. B. Tabata, quem
antes a publicara, em 1945, sob a égide do CNA. Hunton escreveu textos sobre a
fome e a repressão política na África do Sul; ele também realizava um relatório
minucioso e periódico sobre os debates realizados nas Nações Unidas, em
respeito aos nacionalistas africanos da África, da Europa e dos Estados Unidos
da América do Norte. A partir de 1949, a direção do Conselho compôs‑ se
exclusivamente de negros; Robeson foi nomeado presidente, Du Bois vice‑presidente,
e Hunton secretário‑executivo. O Conselho fez então prova de um crescente
radicalismo que lhe valera um aumento da insolência e dos obstáculos impostos
pelo governo norte‑americano; todavia, o Conselho continuou a sua luta em
favor dos africanos até a sua dissolução, em 1955. Ele preparava assim a ação
de um grupo de pressão afro‑americano, melhor implantado e cuja
ocupação consistiria em enfrentar, com ainda maior eficácia, os problemas da
África e do mundo negro.
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