Em síntese: De novembro de 1933
a julho de 1934 o país viveu sob a égide da Assembléia Nacional
Constituinte encarregada de elaborar a nova Constituição brasileira que
iria substituir a Constituição de 1891. Foram meses de intensa
articulação e disputa política entre o governo e os grupos que compunham
a Constituinte. Para o primeiro, a futura ordenação jurídica do país
deveria incorporar o conjunto de mudanças que vinham sendo promovidas
nos campos social, político e econômico. Essas posições também eram
defendidas por lideranças tenentistas eleitas para a Constituinte. Para a
Igreja Católica, o momento era de afirmação e de maior intervenção na
vida política do país. Já para os grupos oligárquicos, a nova
Constituição deveria assegurar aos estados um papel de relevo. O maior
desafio dos constituintes foi tentar encontrar caminhos capazes de
atender a essa gama variada de projetos e interesses.
Dominada a
Revolução Constitucionalista, no final do ano de 1932 e começo de 1933 a
campanha eleitoral para a Assembléia Nacional Constituinte tomou conta
do país. As forças políticas se reorganizaram para aquela que seria a
primeira eleição desde a vitória da Revolução de 1930. Novos
procedimentos haviam sido introduzidos pelo Código Eleitoralde 1932: o
voto secreto, o voto feminino - pela primeira vez na história brasileira
- e a Justiça Eleitoral, encarregada de organizar e supervisionar a
eleição política. O Código previa ainda a formação de uma bancada
classista composta por representantes de funcionários públicos,
empregados e empregadores, eleitos por delegados sindicais.
O
Governo Provisório tratou de tomar iniciativas para poder conduzir os
trabalhos da Assembléia segundo os seus interesses. Criou uma Comissão
Constitucional que elaborou um anteprojeto de Constituição, o qual foi
entregue aos constituintes para ser discutido e emendado. Coube também
ao governo a elaboração do Regimento Interno da Constituinte, ou seja,
do conjunto de regras que iria reger o funcionamento da Assembléia. Com
essas medidas, o governo procurava intervir tanto no conteúdo dos
debates como no seu encaminhamento.
A formação de uma bancada fiel ao governo ficou a cargo do ministro da Justiça, Antunes Maciel,
que promoveu uma intensa articulação política junto aos grupos
oligárquicos regionais. O governo esperava também contar com o apoio de
setores expressivos da bancada classista, que teria 40 representantes
num total de 254 constituintes. Os votos a favor das propostas
governistas deveriam vir principalmente dos representantes dos
strabalhadores, eleitos por sindicatos legalizados pouco antes pelo
ministro do Trabalho, Salgado Filho.
Lideranças
tenentistas que participavam do governo ou estavam próximas dele também
buscaram reunir forças para enfrentar os embates políticos da
Constituinte. Para isso, contaram com o apoio do interventor no Distrito
Federal, Pedro Ernesto, que criou o Partido Autonomista, e do interventor em Pernambuco, Lima Cavalcanti,
que criou o Partido Social Democrático. Já em outros estados, mais
distantes da influência tenentista, os grupos políticos trataram de
formar novas frentes ou partidos regionais. Em São Paulo, o Partido
Democráticoe o Partido Republicano Paulista uniram-se na Chapa Única por
São Paulo Unido. No Rio Grande do Sul, Floeres da Cunha organizou o Partido Republicano Liberal; em Minas Gerais, Gustavo Capanema e Antônio Carlos da Andrada fundaram o Partido Progressista. Finalmente, entre as forças que
participaram das eleições, destacou-se a Igreja Católica, que tinha no
Centro Dom Vitalum núcleo de debates e difusão de idéias e, para a
ocasião, organizou a Liga Eleitoral Católica.
As eleições se
realizaram em maio de 1933 e deixaram clara a vitória dos grupos
políticos regionais. Os "tenentes" obtiveram fraca votação. Dois meses
depois, as entidades de classe indicaram os representantes classistas.
Entre os 254 constituintes foi eleita uma mulher: a médica paulista Carlota Pereira de Queirós, que intensificou a luta pela participação política feminina.
A
Assembléia Nacional Constituinte instalou-se em novembro de 1933. O
confronto entre regionalismo e centralização política dominou os debates
que então se iniciaram. Enquanto os estados do Norte e Nordeste, mais
fracos economicamente e dependentes do governo federal, defenderam o
centralismo, os estados do Centro-Sul reivindicaram maior autonomia em
relação ao poder central.
Após oito meses de discussões,
finalmente, no dia 16 de julho de 1934, foi promulgada a nova
Constituição. A importância dos estados foi assegurada pela vitória do
princípio federalista. Ao mesmo tempo, ampliou-se o poder da União nos
novos capítulos referentes à ordem econômica e social. As minas, jazidas
minerais e quedas d'água deveriam ser nacionalizadas, assim como os
bancos de depósito e as empresas de seguro. No plano da política
socialforam aprovadas medidas que beneficiavam os trabalhadores, como a
criação da Justiça do Trabalho, o salário mínimo, a jornada de trabalho
de oito horas, férias anuais remuneradas e descanso semanal. Mas o
governo sofreu uma importante derrota com a aprovação da pluralidade e
da autonomia sindicais em lugar do sindicato único por categoria
profissional.
Outra novidade importante foi a introdução de um
capítulo exclusivo sobre a família, que em grande parte decorreu da
pressão da bancada católica. Entre outras conquistas, a Igreja obteve a
oficialização do casamento religioso.
A Constituição estabeleceu
ainda que a primeira eleição presidencial após sua promulgação seria
feita indiretamente, pelo voto dos membros da Assembléia Nacional
Constituinte. As futuras eleições deveriam realizar-se pelo voto direto.
No dia 17 de julho Getúlio Vargas foi eleito com 175 votos contra 71 dados aos demais candidatos, entre os quais se incluíam Borges de Medeiros e Góes Monteiro.
A
Constituição de 1934 teve vida curta. Ao mesmo tempo em que tentou
estabelecer uma ordem liberal e moderna, buscou também fortalecer o
Estado e seu papel diretor na esfera econômico-social. O resultado não
agradou a Vargas, que se sentiu tolhido em seu raio de ação pela nova
carta. Em seu primeiro pronunciamento, Getúlio tornou pública sua
insatisfação; em círculos privados, chegou a afirmar que estava disposto
a ser o "primeiro revisor da Constituição".
CPDOC
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