A década de 1930 representou um ponto de inflexão na política externa brasileira, marcada por transformações internas e desafios impostos pelo sistema internacional. A ascensão de Getúlio Vargas ao poder, em 1930, consolidou um projeto de modernização econômica e fortalecimento do Estado, o que influenciou diretamente as relações exteriores do país. Ao longo da década, o Brasil oscilou entre uma aproximação com os Estados Unidos e a Alemanha nazista, adotando uma estratégia frequentemente classificada pela historiografia como "pragmatismo oportunista" ou "jogo duplo". Além disso, o período foi caracterizado pela redefinição das relações com os países vizinhos da América do Sul e pela participação do Brasil na mediação de conflitos regionais, como a Guerra do Chaco.
Com base na bibliografia disponível e considerando o contexto da política externa brasileira na década de 1930, redija um ensaio abordando os seguintes aspectos:
- Reconfiguração das diretrizes diplomáticas pós-Revolução de 1930 – Analise as mudanças na política externa brasileira sob Vargas e os fatores internos que as motivaram;
- A dualidade nas relações entre Brasil, Estados Unidos e Alemanha nazista – Explique os determinantes dessa estratégia, bem como suas consequências para a inserção internacional do Brasil;
- A política de segurança e mediação regional – Avalie a atuação brasileira na América do Sul, com especial atenção à Guerra do Chaco e à redefinição das relações com os países vizinhos;
- Impacto da conjuntura internacional – Relacione a crise de 1929, a ascensão dos regimes totalitários e o realinhamento global com a condução da política externa brasileira;
Extensão máxima: 60 linhas. Valor: 30 pontos.
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Resposta Modelo:
A década de 1930 constituiu um ponto de inflexão na política externa brasileira, ensejando a ruptura com os paradigmas tradicionais que haviam orientado a inserção internacional do país desde a Primeira República. Sob a liderança de Getúlio Vargas, a diplomacia brasileira se alinhou às transformações do Estado, que, em resposta ao colapso da ordem oligárquico-liberal, buscou reforçar sua centralidade e atuar de maneira mais assertiva no sistema internacional. A crise de 1929 acelerou o declínio da hegemonia britânica e abriu espaços para novos alinhamentos, nos quais o Brasil esteve entre os Estados Unidos e a Alemanha nazista, adotando uma estratégia descrita pela historiografia como "Equidistância Pragmática". Ao mesmo tempo, a política externa varguista ampliou a participação brasileira em questões regionais, notadamente na mediação da Guerra do Chaco (1932-1935). Esses fatores, articulados à conjuntura de ascensão dos regimes totalitários e ao realinhamento global que precedeu a Segunda Guerra Mundial, conferem ao período um caráter de transição que redefine as bases da diplomacia brasileira.
O momento impôs a necessidade de adaptação das diretrizes diplomáticas do Brasil a um novo projeto nacional. O Estado, agora fortalecido, passou a instrumentalizar a política externa como mecanismo de promoção do desenvolvimento econômico e de ampliação de sua margem de autonomia na cena internacional. Nesse sentido, rompeu-se com a passividade diplomática da Primeira República, caracterizada pela subordinação às potências hegemônicas e pela dependência exclusiva do modelo agroexportador, principalmente do Café.
A centralização do Ministério das Relações Exteriores sob a liderança de Oswaldo Aranha e, posteriormente, de Afrânio de Mello Franco, evidencia a tentativa de alinhar a política externa aos interesses do Estado nacional-industrial. O Brasil passou a negociar com maior assertividade suas relações comerciais, buscando mitigar os impactos da Grande Depressão e reduzindo sua vulnerabilidade externa. A intensificação da intervenção estatal teve reflexos diretos nas tratativas diplomáticas, uma vez que a diversificação de parcerias comerciais se tornou um imperativo para a superação da crise. Como apontam Ricupero (2017) e Cervo e Bueno (2002), o Brasil inicia, nesse período, uma trajetória de barganha estratégica, explorando as rivalidades entre as grandes potências para obter vantagens materiais e ampliar sua capacidade de manobra no sistema internacional.
O pragmatismo varguista manifestou-se de forma mais evidente na ambiguidade das relações entre Brasil, Estados Unidos e Alemanha. Se a tradição diplomática do período republicano havia consolidado a preponderância norte-americana como parceiro estratégico, a ascensão do regime nazista abriu novas possibilidades de cooperação econômica e tecnológica, tornando a Alemanha um dos principais destinos das exportações brasileiras, chegando a ser, em 1938, nosso maior parceiro comercial. Conforme demonstram Cervo e Bueno (2002), a participação alemã no comércio exterior brasileiro aumentou consideravelmente ao longo da década, com destaque para a absorção da produção cafeeira e para o fornecimento de bens manufaturados, essenciais ao processo de modernização industrial empreendido pelo governo Vargas, tudo isso em modelo de comércio compensado, que facilitava as trocas sem u uso de moeda.
No entanto, essa aproximação não representou, de forma absoluta, um total alinhamento ideológico, mas antes um cálculo pragmático que visava maximizar os benefícios decorrentes da rivalidade entre Washington e Berlim. O Brasil soube explorar as disputas geopolíticas, obtendo concessões tanto dos Estados Unidos, que buscavam consolidar sua hegemonia hemisférica no contexto da Política da Boa Vizinhança, quanto da Alemanha, cujo expansionismo econômico favorecia acordos vantajosos para a economia brasileira. Essa estratégia permitiu ao país a obtenção de financiamento para projetos de infraestrutura e para o desenvolvimento de sua indústria siderúrgica, como evidenciado no caso da Companhia Siderúrgica Nacional, viabilizada por investimentos norte-americanos em 1940.
Contudo, à medida que a Segunda Guerra Mundial se avizinhava, a margem de manobra do Brasil foi progressivamente reduzida. O expansionismo do Eixo e a crescente pressão de Washington levaram ao esgotamento do "jogo duplo" e à necessidade de um alinhamento definitivo. A diplomacia brasileira, nesse sentido, demonstrou grande habilidade em adiar sua decisão até que fosse possível obter o máximo de vantagens possíveis, um traço que se consolidaria como característica fundamental da política externa do país nas décadas subsequentes. O aprisionamento de navios brasileiros na Europa pelo Reino Unido, e a negociação, mediada pelos EUA, para liberá-los, deixava claro que era hora de parar.
No plano regional, a diplomacia brasileira procurou reforçar sua influência na América do Sul, desempenhando papel de mediador em conflitos estratégicos. A participação do Brasil na solução da Guerra do Chaco (1932-1935), disputada entre Paraguai e Bolívia, insere-se nesse contexto. O envolvimento do Itamaraty na mediação do conflito representou um esforço de projeção de poder regional, consolidando a imagem do Brasil como ator estabilizador no continente.
Essa atuação deve ser compreendida à luz do contexto geopolítico do período. O Brasil buscava contrabalançar a influência argentina, que, por sua vez, mantinha laços históricos com o Paraguai e aspirava à liderança regional. A mediação brasileira, conduzida sob a égide da Liga das Nações e em parceria com os Estados Unidos, reforçou a posição do país como interlocutor privilegiado nas questões sul-americanas, antecipando a inserção mais ativa do Brasil nos fóruns internacionais a partir da década de 1940.
O contexto internacional da década de 1930 exerceu influência determinante sobre a política externa brasileira. A crise de 1929 desestruturou a ordem econômica liberal, minando a primazia britânica e acelerando a reconfiguração do sistema internacional. A ascensão dos regimes totalitários e a polarização entre as potências tornaram a estratégia de equilíbrio cada vez mais difícil de sustentar.
Nesse cenário, o Brasil adotou uma postura de flexibilidade estratégica, buscando explorar as oportunidades oferecidas pela conjuntura internacional sem comprometer sua autonomia decisória. Essa postura, contudo, teve limites: com o avanço da Segunda Guerra Mundial, tornou-se inevitável o alinhamento com os Estados Unidos, que passaram a exigir contrapartidas concretas em troca do apoio econômico e militar concedido ao Brasil. A progressiva aproximação entre Vargas e Roosevelt, consolidada nos primeiros anos da década de 1940, marcaria o fim do período de "jogo duplo" e o início de uma nova fase na política externa brasileira, pautada pelo alinhamento ao bloco ocidental no contexto da Guerra Fria que se iniciaria após o conflito mundial.
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