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América Latina no século XX



O presidente Theodore Roosevelt, um homem que durante sua administração (1901-1909) combateu os grandes trustes da economia norte-americana, foi, simultaneamente, um implacável expansionista. Na sua visão política, ao tempo em que ele enfrentava os gigantes empresariais dentro de casa, ele também o devia fazer fora, desmoralizando as oligarquias latino-americanas, suas vizinhas a quem considerava uma variante do banditismo. Profundamente convicto da missão dos Estados Unidos num mundo corrupto, ele recorreu a uma política externa agressiva que lhe deu o controle do Golfo do México e Mar do Caribe, recorrendo para tanto ao corolário que tomou o seu nome, abrindo os mercados do continente às práticas da chamada "diplomacia do dólar". As sucessivas intervenções dos Estados Unidos na América Central e nas ilhas do Caribe, ao longo do século XIX, muitas vezes não passavam de estripulias de flibusteiros. Havia a necessidade de algum ato oficial que desse estatuto jurídico ao papel político norte-americano na região. A oportunidade surgiu com o bloqueio que as forças navais conjuntas com a Inglaterra, Itália e Alemanha aplicaram aos portos da Venezuela em dezembro de 1902. O ditador Cipriano Castro, denunciando os juros como extorsivos, absolutamente lesivos aos interesses nacionais, recusara-se a reconhecer as dívidas venezuelanas para com os banqueiros europeus. Num sistema financeiro que não possuía instituições que permitissem a ação de mecanismos legais de cobrança, os bancos de então mobilizaram as forças-tarefas de seus respectivos países. Contando com o consentimento do Departamento de Estado norte-americano para realizar a operação de execução de cobrança, o bloqueio aos portos venezuelanos, realizado pelos navios da esquadra italo-anglo-germano, atingiu proporções dramáticas quando os canhões alemães bombardearam o Forte de S. Carlos e destruíram uma cidade da beira do Caribe, em 1903. E, para desgraça dos Venezuelanos, em 1904 o Tribunal de Haia ainda deu razão aos que faziam o bloqueio.
A doutrina Drago e o corolário Roosevelt
Este acontecimento provocou duas reações. De um lado, os latino-americanos apoiaram a chamada Doutrina Drago, proposta pela Argentina no Congresso Panamericano de 1906, que, retomando a Doutrina Calvo, implicava na supressão do uso da força para exigir o pagamento de dívidas entre nações e, de outro, Roosevelt elaborou um corolário à Doutrina Monroe. Os Estados Unidos tinham que agir. Como ativo candidato ao protetorado do Novo Mundo, não poderiam doravante assistir impassíveis às manobras de uma frota naval européia, armada até os dentes, agindo em águas consideradas fundamentais para a potência do Norte. Aceitando a sugestão do primeiro-ministro inglês, Arthur Balfour, segundo a qual a Grã-Bretanha se absteria de qualquer futura intervenção desde que os Estados Unidos assumissem a responsabilidade de fazer com que não surgissem mais a necessidade desse tipo de intervenção, Roosevelt, em 20 de maio de 1904, assim se expressa: "A insistência no erro, da parte de alguma nação americana, poderia exigir a intervenção de outra nação civilizada", fazendo com que a "fidelidade dos Estados Unidos à Doutrina nos leve ... a exercer um poder de polícia internacional". Assim, se a Doutrina Monroe era a negação do direito das potências européias estenderem seu domínio territorial sobre o Novo Mundo, a partir de 1904, com o corolário Roosevelt, ela passou ser interpretada como uma afirmação do direito dos Estados Unidos de intervirem na política da América Latina.
A independência cubana
A idéia de que a ilha de Cuba, "a pérola do Caribe", era uma espécie de prolongamento do litoral norte-americano, um quase quintal dos interesses nacionais, já fazia parte do jingoísmo americano pelo menos há mais de meio século. Senão desde os tempo em que Thomas Jefferson, por volta de 1803, tentou comprar a ilha do governador espanhol local. O New York Sun, em 1847, afirmava ser a ilha não só "o jardim do mundo" como "a chave do Golfo". Para os Knights of the Golden Circle (Os Cavaleiros do Círculo Dourado), uma associação secreta sulista, organizada em 1854, a ilha era apenas uma peça no sonho deles de construir um império caribenho que abarcaria além naturalmente dos estados sulistas dos Estados Unidos, a anexação da maior parte do território do México, o Caribe, a América Central, incluindo até a Venezuela e a Colômbia. Tratava-se de uma vastíssima extensão de terras, dominada por grandes proprietários voltados todos à exploração de um reino escravocrata, dedicado à produção do tabaco, açúcar, do arroz e café. E, no transcorrer do século XIX, muitos membros da oligarquia cubana viam nos Estados Unidos um sólido protetor da manutenção da escravidão e da monocultura açucareira, onde estavam investidas suas fortunas. Assim, se a Espanha tentasse abolir a ordem vigente, ameaçavam solicitar a anexação da ilha por parte dos Estados Unidos. Foi com tristeza que assistiram à derrota dos confederados na guerra civil, pois com eles naufragava a possibilidade da perpetuação da escravidão em Cuba2. A corajosa luta dos revolucionários cubanos para obterem sua independência colheu imediata simpatia junto à opinião pública norte-americana. No entanto, esta simpatia terminou sendo canalizada por grupos jingoístas liderados principalmente por Theodore Roosevelt e pelo dono de uma cadeia de jornais da imprensa marrom W. R. Hearst. Estes viram na rebelião a possibilidade dos Estados Unidos controlarem não apenas a ilha de Cuba, mas todo o Caribe.
Certamente pesara na adoção da política intervencionista o aumento dos interesses norte-americanos em Cuba, onde cerca de 50 milhões de dólares estavam investidos no açúcar e em indústrias extrativas, sendo que o comércio, já em 1893, ultrapassava a marca de 100 milhões de dólares, fazendo com que os mais variados negócios e interesses de navegação dependessem dele3. Era a grande oportunidade. O governo McKinley rapidamente avançou para posições mais belicosas.
Em setembro de 1897, o presidente norte-americano havia oferecido seus bons ofícios para pacificar a ilha. No entanto, a explosão do Maine, que estava ancorado na baía de Havana, em 15 de fevereiro de 1898, tornou a situação inconciliável. Como sempre ocorre nessas ocasiões, a tragédia que engolfou o encouraçado serviu como faísca para uma explosão belicista por parte da opinião pública norte-americana. As 260 vítimas da catástrofe foram servidas numa grande travessa para o jantar dos jingoístas de Washington. Era preciso vingá-las! Mesmo com a oposição do presidente McKinley, o confronto passou a ser inevitável, fazendo com que este terminasse por enviar a mensagem de guerra ao Congresso. O ato provocou grande regozijo nacional, pois a campanha contra a Espanha era vista como uma generosa dádiva do "império benéfico" para com o sofredor povo cubano. Como resultado deste estado de espírito, foi aprovada a emenda Teller, pela qual os Estados Unidos renunciavam a "qualquer intenção ou disposição de exercer soberania, jurisdição ou controle sobre a dita ilha". Atendendo ao apelo para a convocação militar, duzentos mil voluntários se apresentaram, dos quais apenas 18 mil foram realmente empregados. A campanha foi curta e vitoriosa, durando ao todo menos de oito meses. Desembarcadas nas ilhas, as forças norte-americanas passaram rapidamente à ofensiva, derrotando as esquálidas forças ibéricas em Las Grasimas, El Caney e San Juan, onde Roosevelt chefiou seus "Bravos Cavalheiros" numa carga que lhe abriu as portas da Casa Branca. A esquadra americana, por sua vez, pôs a pique o que restava da força naval espanhola na Baía de Santiago em 19 de maio de 1898. A fuga do almirante Cervena a nado encerrava com um melancólico epitáfio, o domínio espanhol na região, domínio que se estendera por mais de quatrocentos anos desde a chegada da esquadra de Colombo em 1492.
Pouco mais de cem dias após a declaração de guerra, o Presidente McKinley ditava a paz com a Espanha, em 30 de julho. Posteriormente, pelo Tratado de Paris, a Espanha renunciava a Cuba, Porto Rico e Filipinas. O velho império espanhol cedia seu lugar ao novo imperialismo4.
Quanto a Cuba em si, terminaria por confirmar os temores de Martí, que sustentava que um país que tem sua base econômica num só cultivo se vende a si mesmo como escravo. Situação concreta, ressaltada em 1901 pela Emenda Platt à Constituição cubana, pela qual se concedia aos Estados Unidos o direito de intervir nos assuntos internos da nova república, negando à ilha, bem como à vizinha ilha de Porto Rico, a condição jurídica de nação soberana. Para não pairar dúvidas sobre a situação que Cuba se encontrava depois da Guerra Hispano-americana, as autoridades militares ianques nem se deram ao trabalho de convidar os chefes dos guerrilheiros cubanos que haviam lutado pela independência, ombro a ombro com eles, para a cerimônia da rendição dos oficiais espanhóis, em Havana. O destino final desta "revolução frustrada" de Martí se fez pela revolução fidelista sessenta anos depois, tendo como objetivo a redenção da soberania econômica e política de Cuba5.
Wall Street e os emirados financeiros
Os efeitos econômicos do corolário logo se fizeram sentir e, junto com eles, a desagradável presença dos fuzileiros. Devido às restrições feitas pela nova interpretação da Doutrina Monroe a cobranças forçadas, os banqueiros europeus mostravam-se pouco inclinados a emprestar dinheiro aos latino-americanos, praticamente abandonando o mercado do crédito da região aos financistas de Walt Street. Mas estes não estavam dispostos a verem seus investimentos ameaçados e passaram a exigir tanto a participação ativa no controle das alfândegas como a proteção formal do governo dos Estados Unidos aos empréstimos que eles concediam aos governos e às oligarquias. Na prática, isto transformou o Haiti, a República Dominicana e a ilha de Cuba, cronicamente endividados, em "emirados financeiros" sujeitos à ocupação permanente.
O Canal do Panamá
Inspirado na vitória sobre a Espanha na guerra de 1898 e nas evidentes vantagens estratégicas que lhe proporcionaria a construção de um canal que ligasse os oceanos Atlântico e Pacífico, cortando a província colombiana do Panamá, o presidente Theodore Roosevelt, apelando para meios pouco convencionais, lançou as bases concretas para que o seu país se tornasse uma potência mundial. Pode-se considerar que um dos maiores obstáculos à construção de um canal que ligasse o Oceano Atlântico ao Pacífico, por parte dos norte-americanos, era a presença inglesa no Caribe. A Grã-Bretanha era ainda senhora de numerosas possessões na região, tais como as ilhas Bermudas, Bahamas, Virgens Britânicas, Antígua, Trinidad-Tobago e uma base naval nas Honduras Britânicas (atual Belize). Assim, qualquer projeto ambicionado por parte dos norte-americanos naquela região estratégica implicava em algum tipo de entendimento com os ingleses.
Como resultado desse impasse, ambos firmaram o Tratado Clayton-Bulwer, pelo qual concordavam em não construir um canal sem a mútua participação ou consentimento. Theodore Roosevelt, percebendo as vantagens estratégicas de dar começo a uma grande construção cortando o istmo, não hesitou, pagando 40 milhões de dólares pelas ações da antiga companhia francesa falida. Depois dos tratados Hay-Paucefote, a Inglaterra não somente desistiu de ser sócia na construção de um conduto interoceânico como também aceitou que os Estados Unidos fortificassem militarmente a futura Zona do Canal. Livre dos impedimentos internacionais, Roosevelt tratou de obter a permissão do Congresso para iniciar as obras (Lei Spooner). A Colômbia, no entanto, mostrou-se arredia. Como a concessão que havia dado à companhia de Lesseps estava para findar em 1903, esperavam os seus governantes revendê-la a um preço mais compensador para a república. Roosevelt entendeu o gesto dos colombianos como uma extorsão, classificando-os nada mais do que bandidos. Foi então que o big stick os atingiu.
Em outubro de 1903, os funcionários da companhia sediada no Panamá, aliados a José Augustin Arango, o representante da Panama Railroad Company, chefe da junta local, foram estimulados a criar um movimento separatista, proclamando a independência da região do Panamá. Vindo em socorro desse pseudomovimento autonomista, os fuzileiros norte-americanos, a bordo do encouraçado Nashville, desembarcam em Cólon, impedindo a reação dos colombianos. Ironicamente, os Estados Unidos alegaram estarem cumprindo com os dispositivos de um antigo tratado, o Bidlack-Mallarino, firmado em 1846, que os permitia auxiliar a Colômbia a restabelecer a ordem caso a área do istmo estivesse conflagrada por alguma desordem qualquer. À república da Grã-Colômbia, mutilada com a perda daquela província, nada mais restou do que aceitar o fato consumado de que doravante os norte-americanos seriam os senhores de fato das terras panamenhas.
Em novembro de 1903, firmou-se em Washington o Tratado Hay - Bunau Varilla, também chamado de Isthmian Canal Convention, que dava aos Estados Unidos o domínio perpétuo sobre uma zona de 16 km de largura através do istmo, de um costa a outra. Em troca, os Estados Unidos da América pagariam dez milhões de dólares e um arrendamento de 250 mil dólares anuais aos panamenhos2. Posteriormente, este tratado foi várias vezes denunciado por patriotas panamenhos, pois Bunau Varilla não era cidadão panamenho, mas sim um simples sócio de uma empresa concessionária francesa.
Em 1904, assumindo o protetorado sobre o Panamá, o governo americano tomou posse formalmente da Zona do Canal, dando início às obras que seriam concluídas dez anos depois, em 15 de agosto de 1914, ao preço de cinco mil mortos, vítimas da malária e da febre amarela, e a um custo de 360 milhões de dólares, o Canal foi aberto ao comércio do mundo. Para tentar cicatrizar as feridas abertas no sentimento nacional dos colombianos, os Estados Unidos, posteriormente, em 1921, num tratado especial de reconciliação, indenizaram a república com 25 milhões de dólares. Inspirados na grande estratégia do almirante Mahan, a América do Norte passava assim a ser uma potência de projeção mundial com a possibilidade de exercer o controle sobre os dois grandes oceanos.
O peronismo
uan Domingo Perón, presidente e quase ditador da Argentina. Sua doutrina ainda vive, embora ele e sua mulher Evita tenham morrido há muito tempo.

Na década de trinta, a vida política argentina estava falida devido a uma série de fracassos e fraudes vinculados ao poder dos estancieros, exportadores agropecuários e banqueiros britânicos. Isso tudo seria verdadeiramente abalado alguns anos depois quando com o surgimento de Perón e a transformação do peronismo em expressão política das massas. Perón surgiu junto aos setores populares e oficializou sindicatos, valendo-se de uma estratégia que lhe possibilitou, a um só tempo, atrair os trabalhadores para si e subordiná-los mediante uma organização sindical de tipo estatal.

O surgimento de Perón na cena política se deu a partir dos anos 40.

Em 04 de junho de 1943, num dos golpes militares que se generalizaram neste século na vida política argentina, o General Pedro Ramírez ocupou o governo. Ramírez pertencia ao GOU (grupo secreto) que contava com Perón entre seus membros. Uma vez no governo, Ramírez decretou a dissolução dos partidos políticos, implementando uma política indefinida, complicada ainda mais pela pressão de ter que tomar uma posição diante das potências mundiais em guerra. Perón, nessa conjuntura, foi nomeado chefe da Secretaria de Trabalho, cargo a partir do qual começou a promover sua estratégia de inserção popular. Assim, por meio destes primeiros eventos históricos da carreira política de Perón, consolidou-se um partido político, um bloco feminino e um conjunto de organizações sindicais que, junto ao apoio popular, conformaram o chamado movimento peronista.

O peronismo implementou na década de 40, um modo inovador de fazer política na Argentina, com base na participação de trabalhadores e sindicatos. As estratégias do poder, até então, tinham seguido a tradição contrária, pondo em prática políticas que tratavam com arrogância os mais pobres e menos organizados. Recluídas nessa visão, as elites, banqueiros, fazendeiros e, mais tarde, industriais, não eram capazes de perceber em que medida a força popular viria a ser protagonista da vida política argentina. A massa ganhou definitivamente seu espaço político na história argentina com Perón, e Perón com as massas. Por isso é que o surgimento do peronismo, com seu impacto sobre os setores populares, deixou os partidos tradicionais num verdadeiro impasse e ainda surpreendeu os partidos de esquerda, uma vez que eles, mesmo sendo anteriores ao peronismo, não tinham conseguido uma adesão popular dessa dimensão.

Com a oposição absolutamente dominada, Perón foi reeleito presidente em 1951.
Sua mulher, Eva Perón, conhecida como Evita, ex-artista de rádio e de cinema, era idolatrada pelos pobres da Argentina. Começou a trabalhar com o marido no programa de reformas sociais e foi chamada de "mãe dos descamisados".

Em julho de 52, Evita morreu de leucemia. Quase um milhão de argentinos acotovelaram-se para seguir o cortejo do seu funeral. Com sua morte, o país perdeu a estabilidade e a popularidade de Perón começou a declinar.

Após sucessivas crises durante três anos, a chamada "revolução da libertação", liderada pelo exército e apoiada pela Igreja, depuseram Perón, que seguiu exilado para a Espanha.

Mesmo do exílio, o carismático Perón continuou a exercer forte influência na Argentina. Em Torremolinos, na Costa do Sol espanhola, ele esperou por seu destino. A fotografia de sua mulher Evita, sua partidária mais leal, estava sempre por perto.

Em 1971, teve início uma campanha para a volta de Perón. Seus partidários exerceram tanta pressão que, após 17 anos de exílio, ele foi anistiado. Em 72, o Partido Peronista sobiu ao poder e Héctor Cámpora tornou-se presidente.

Perón voltou em triunfo para um país dividido e tenso. Três meses após sua volta, Héctor Cámpora não resistiu mais à pressão do Partido Peronista e deixou a presidência.

Em primeiro de julho de 74, um ano depois de uma apoteótica vitória eleitoral, Juan Domingo Perón morre aos 77 anos de idade. Embora muitos o chamassem de fascista e ditador, ele foi o símbolo do movimento trabalhista da Argentina.

Até hoje se vêem pôsteres de Perón e Evita nas paredes de Buenos Aires. Isabel, a terceira mulher de Perón, substituiu o presidente, mas em 76 foi é deposta por um golpe militar. Os sucessivos governos militares tentaram apagar a imagem do peronismo, ou justicialismo, uma doutrina que até hoje vive nos corações de muitos argentinos.
A Aliança para o progresso
A Revolução Cubana, por sua vez, teve efeitos perduráveis sobre a história política e social da América Latina, similares aos da Revolução Francesa de 1789 e da Revolução Russa de 1917. Em todos estes eventos revolucionários, que tiveram conseqüências muito além das sus fronteiras nacionais, uma vasta coligação contra-revolucionária se estruturou para esmagar seus efeitos. A Revolução Francesa e o Império napoleônico tiveram contra si a reação da Santa Aliança, a coligação das dinastias legitimistas, que se estendeu de 1815 a 1848. A Revolução Russa provocou contra ela a emergência do nazi-fascismo, que, iniciado em 1919, prolongou-se até a sua destruição em 1945. Por sua parte, a Revolução Cubana fez desencadear o mais violento ciclo de ditaduras militares da história contemporânea da América Latina, com a conseqüente formação dos regimes de Estado de Segurança Nacional inaugurados pelo golpe militar de 31 de março de 1964 no Brasil, e que, depois, foi imitado em quase todos os países da América do Sul.4 Desta maneira, o projeto kennedyano que visava estabelecer um Estado Reformista e Democrático na América Latina, redundou em pouco tempo na institucionalização de um Estado Policial Autoritário.
O governo Kennedy viu-se terrivelmente embaraçado com os resultados da malograda intervenção em Cuba. O jovem presidente tentava criar uma nova imagem dos Estados Unidos, libertando-o da casmurrice reacionária de John Foster Dulles e do imobilismo conservador e redundante de Eisenhower. Kennedy e os seus brain trust, um circulo altamente qualificado de intelectuais liberais, havia reativando algumas bandeiras do reformismo social desfraldadas anteriormente por Franklin D. Roosevelt, nos anos trinta, operação que ele denominou de New Frontier, a Nova Fronteira, uma retomada do espirito do New Deal . Segundo o que Kennedy afirmara no seu discurso de posse “ A tocha havia passado para uma nova geração de americanos”, o que também significava moderar o vício intervencionista nos assuntos internos dos seus vizinhos.
A política do New Deal teria então seguimentos com a política da Nova Fronteira, que implicava num conjunto de políticas reformistas que deveriam ser postos em prática, estendendo-se para muito além das fronteiras dos Estados Unidos. Na verdade, tratava-se de empenhar o prestígio do governo Kennedy na execução de um vasto plano de reforma imperial que servisse, especialmente na América Latina, como alternativa social ao comunismo. Justamente quando essa nova imagem dos Estados Unidos, compromissado com reformas sociais e com o aprofundamento da democracia começava a difundir-se, ocorreu o desastre da Praia Girón. Uma nuvem de suspeição vinda do Terceiro Mundo lançou sombras sobre a sinceridade do novo presidente.
A aliança para o progresso


Em outubro de 1960, percebendo perfeitamente a tentação que o fidelismo poderia representar para a América Latina empobrecida e desesperançada, Kennedy tomou a iniciativa de lançar as bases da Aliança para o Progresso, algo assim como um “bactericida ideológico”, como então se disse, destinado a proteger o corpo político latino-americano extirpando o germe revolucionário do continente. Ao contrário dos pachorrentos governos republicanos, Kennedy possuía a intuição do perigo e sentia a necessidade de combatê-lo com outros recursos que não os da repressão pura e simples.
Em princípios de 1961, um grupo de trabalho liderado por Adolf Berle, Lincoln Gordon e outros brain trust que prestavam assessoria ao presidente , apresentou um relatório com as diretrizes a serem seguidas doravante pela política norte-americana em relação à América Latina. Em linhas gerais, este documento preconizava as seguintes medidas: a) os Estados Unidos deveriam liderar um processo de transformação social na América Latina, desvinculando-se das oligarquias reacionárias; b) era necessário reduzir as iniqüidades sociais existentes na América Latina, as quais forneciam um poderoso argumento aos marxistas que atacavam os Estados Unidos; c) os Estados Unidos não deveriam apostar exclusivamente nos méritos da repressão mas sim empenhar-se num projeto de mudanças que empolgasse os povos latino-americanos, afastando-os da tentação revolucionária; d) por último, o novo governo deveria estimular alianças com setores moderadamente reformistas e populares existentes nos círculos latino-americanos, marginalizando os direitistas.5 Este ambicioso e audaz projeto implicava em que os Estados Unidos se comprometessem, inclusive, com a política de reforma agrária, para neutralizar a secular insatisfação camponesa contra as oligarquias.
O Foquismo
Para as esquerdas em geral, Fidel Castro e seus companheiros da Sierra Maestra, haviam descoberto a álgebra da revolução. O sonho dos missionários da redenção continental materializou-se especialmente na pessoa do segundo homem da revolução cubana, Ernesto Che Guevara, o herói par excelence – que, como um cavaleiro andante, carregava a chama da insurgência, espalhando a esperança da igualdade social através da luta antiimperialista. As novas esquerdas, particularmente compostas por estudantes e intelectuais, afastavam-se dos moderadíssimos Partidos Comunistas latino-americanos, já profundamente abalados e divididos pelo conflito ideológico entre a URSS e a China, aderindo à teoria do foquismo defendida por Che Guevara. Segundo a evidência exposta a partir da experiência cubana, um grupo corajoso e audaz de revolucionários decididos a tudo, bravos e determinados, sem levar em considerações as condições objetivas mais gerais, poderia deflagrar a luta insurrecional num ponto qualquer de um país e, a partir dali, com seu exemplo heróico, incendiar os ânimos das massas para a causa da Revolução, Tratava-se, para os demais revolucionários do continente, que começaram a brotar de todos os lados, de levar à prática o desejo de Guevara em vir a “transformar os Andes numa nova Sierra Maestra”. O verdadeiro revolucionário, pois, devia dar as costas às práticas parlamentares tradicionais e ao jogo dos sistemas democráticos e embarcar logo na estrada da revolução armada. O que transformaria a sempre injusta realidade social latino-americana era o fuzil e não a palavra. A América Latina por inteiro poderia ser convulsionada a partir de um foco revolucionário, tal como uma minúscula fogueira acesa numa clareira facilmente incendeia uma floresta. A crescente polarização das forças políticas, decorrente da Revolução Cubana, tornou impossível aos norte-americanos sustentarem políticas reformistas, mesmo que fossem modestas. Para as esquerdas latino-americanas elas eram insuficientes, não passavam de manobra propagandística ou senão paliativos inconseqüentes, feitos apenas para dar uma boa publicidade aos norte-americanos junto à opinião pública internacional. Para a direita, mesmo a mais modesta concessão no campo econômico ou político era sinônimo de subversão social, um convite aberto à insubordinação das massas para com seus dirigentes, era abrir a perigosa Caixa de Pandora social, liberando demandas que eram impossíveis de serem atendidas. A reforma, qualquer que fosse, era o vestíbulo da revolução, a ante-sala do desastre. A prova da opção por uma política cada vez mais conservadora, já manifesta na etapa final do governo Kennedy, foi a gradativa adoção pela administração democrata dos pontos de vista defendidos por John Davis, um ex-diplomata que afirmava: “A questão básica não é ser o governo ditatorial ou representativo e constitucional. A questão é se o governo, a despeito do seu caráter, pode manter a sociedade estruturada o bastante para fazer a transição”.7 Desta maneira, já em 1963, estavam lançados os princípios fundamentais para a adoção dos pontos de vista de Thomas Mann, subsecretário de estado (em 1964), e do secretário de estado Robert McNamara (em 1967) , que concordavam em sacrificar a democracia em favor da segurança continental. Se o acirramento da luta ideológica e política entre esquerdistas e direitistas, que se alastrou por toda a América Latina nos anos de 1960, foi o responsável pelo congelamento e depois abandono da Terceira Via, não se deve esquecer a tradicional incapacidade política norte-americana em liderar reformas. Além disso, a política das reformas previstas pela Terceira Via deveria receber a entusiástica adesão por parte das oligarquias latino-americanas. Afinal, delas é que partiria parte ponderável dos recursos necessários às transformações pretendidas pela Aliança para o Progresso. Ora, tradicionalmente, estas oligarquias, sempre que ameaçadas pelas classes subalternos, inclinaram-se pela repressão e não pela reforma social. Chile: a derrubada da democracia
(de Allende a Pinochet)
A via chilena para o socialismo

"Eu quero terra, fogo, pão, açúcar, farinha, mar, livros, pátria para todos, por isso ando errante..." Pablo Neruda - Canto geral, XIII,XV

O primeiro ano de governo da UP foi o da aplicação do Plano Vuskovic que estimulou uma alta salarial que chegou a 55%, adotada para expandir a industria nacional que operava com enorme capacidade ociosa. Conjugaram-na com um aumento dos gastos públicos que atingiu a 66% a mais do que o governo anterior. A idéia era de que a ampliação do mercado consumidor - formado por trabalhadores bem remunerados - induziria os empresários a investirem na produção. Ao mesmo tempo os socialistas esperavam que o bom padrão de vida que ofertavam aumentaria as bases políticas do que chamavam de “a via chilena para o socialismo”. Com a adesão da classe média pensavam em atingir a estabilidade necessária a sua sobrevivência. Esta linha de ação contava com o apoio dos socialistas-allendistas e dos comunistas de Luís Corvalán, os mais moderados integrantes da frente, mas não com o do influente senador Carlos Altamirano que, apesar de militar entre os socialistas, defendia a “via leninista”, ou “insurgente,” para tomar o poder.

Passados doze meses do Plano Vuskovic verificou-se que os investimentos na economia não se realizaram. Um dos motivos deveu-se a que os extremistas estimularam os trabalhadores chilenos a apropriarem-se das fábricas, recorrendo a um sofisma legislativo chamado de “resquícios legais”, afim de “criar o poder popular”. No campo a situação não diferiu. Uma onda de invasões de terras levou à paralisação da agricultura e a uma alta geral dos gêneros alimentícios, estimulando o crescimento do mercado negro.

Simultaneamente, Allende nacionalizou a mineração e outros setores considerados fundamentais para chegar-se ao socialismo, o que abriu contra ele um outro fronte de luta com as multinacionais.

Entre 1972-73 a economia chilena literalmente parou. A tensão social aumentou enormemente e os conflitos entre os operários e os outros setores sociais se ampliaram. A escassez geral, as filas, o mercado negro, fizeram com que as classes médias abandonassem qualquer simpatia que anteriormente tivessem pelo regime ou pelo ordenamento democrático. O resultado político disto foi a passagem da Democracia Cristã para a oposição extremada, golpista. As classes médias ao voltarem suas costas para Allende, estimularam sua derrubada.
Síntese do Programa Geral da UP

1- Política de redistribuirão de renda (no Chile 2% da pop. detinham 46% da renda)

2- Nacionalização da grande industria, especialmente da mineração de cobre

3 -Ampliação e expansão da reforma agrária

4- Aproximação diplomática e econômica com os países socialistas e comunistas
Uma das razões mais amplas do fracasso da “via chilena para o socialismo” deveu-se ao quadro mundial de então. Vivia-se em plena Guerra Fria e os Estados Unidos engajado na Guerra do Vietnã não podiam aceitar tranqüilamente a existência de um regime socialista na sua área de influência (*). Esta foi a razão de Henry Kissinger, assessor do presidente Richard Nixon, ter dito que o governo americano “não podia ficar parado aguardando um pais tornar-se comunista devido a irresponsabilidade do seu povo”. Além disso a política das nacionalizações e estatizações adotada pela UP (O Estado chegou a controlar 60% da economia nacional) feria os interesses das grandes corporações americanas, como no caso da ITT, um empresa telefônica e de comunicações que passou a pressionar o governo Nixon “a tomar providências”.

Não demorou muito para que o Chile se encontrasse submetido a um bloqueio informal (como Allende denunciou num dramático discurso na ONU). Não conseguindo empréstimos internacionais e nem bons preços para o cobre, o seu principal produto de exportação. A estratégia americana foi sufocar gradualmente a economia chilena até que um levante das Forças Armadas pusesse fim a “via chilena para ao socialismo”, ou como disse o embaixador americano em Santiago: “não permitiremos que nenhuma noz nem mesmo um parafuso venha a enriquecer o Chile de Allende”. Richard Nixon no seu despacho ao Departamento de Defesa fora enfático: “Há uma chance em dez, mas salvem o Chile, façam a economia guinchar!”

Entrementes o quadro latino-americano que o cercava também era hostil a Allende. Nos anos de 1970, na América do Sul inteira, apenas o Chile, a Colômbia e a Venezuela mantinham Estados de Direito com governantes eleitos pelo povo. Solidariedade e simpatia socialista ele só obteve de Fidel Castro cujo auxilio prático era nenhum. O Brasil, a Argentina, o Paraguai, a Bolívia, o Peru, o Equador e logo o Uruguai, encontravam-se ocupados por regimes militares. Também pesou na derrubada de Allende, o sucesso econômico do ditadura do general Médici (1969-74) que fez com que o Brasil tivesse um crescimento entre 9 a 11% anuais, estimulando com seu exemplo, de Estado Autoritário, anti-comunista e antidemocrático, a que os militares chilenos arriscassem implantar um modelo similar.

Mas o fator fundamental que levou ao golpe militar foi o quadro interno. O descalabro econômico que atingiu o governo da UP fez com que a inflação saltasse para patamares desconhecidos na história do Chile (em 1971 a inflação foi de 22,1%: em 1972 aumentou para 163,4%, e, no ano do golpe, em 1973, atingiu o clímax com 381,1%), fazendo com que O PNB sofresse, neste tempo, uma queda de 9,0 (positivo) para - 4,2 (negativo).

As próprias bases políticas da UP manifestaram o seu desconforto com a greve da mina El Teniente e o protesto estudantil demonstrado contra a ENU (Escola nacional Unificada: um plano do Ministro da Educação que visava um padrão comum, baseado em valores socialistas, para toda a educação, e que foi apontado como uma tentativa de doutrinar os estudantes). Neste clima de enfrentamento, tanto a esquerda extremista como a extrema-direita do “Patria y Libertad” mobilizaram-se. Os integrantes do MIR fizeram chegar ao Chile armas soviéticas vindas de Cuba, enquanto os direitistas articulavam-se com a CIA (a agencia americana gastou U$ 12 milhões de dólares financiando greves, especialmente a dos caminhoneiros) e com setores militares. Por toda a parte multiplicavam-se os atentados e assassinatos, e as greves gerais não paravam de eclodir.

(*) Segundo o livro de William Blum “Killing Hope”, o envolvimento direto dos E.U.A. com a política chilena começou na administração do presidente John Kennedy. Desde que Allende perdera a eleição de 1958 por apenas por 3% dos votos, os americanos não podiam mais depender “da providência ou da democracia”. Para tanto criou-se um comitê, um em Washington e o outro em Santiago, para coordenar as eleições de 1964. O candidato dos americanos, o democrata-cristão Eduardo Frei recebeu U$ 20 milhões de dólares para vencer Allende (o resultado foi 56% a 39%). Em 1970, para derrubar Allende, a CIA criou o Projeto Fulbert que abarcou um amplo conjunto de atividades que iam de apoio a assassinatos seletivos e fomentar greves, a contatar políticos e militares direitistas para articularem um golpe de estado.
Em agosto de 1973, um mês antes do desenlace, com a intermediação do arcebispo do D. Raúl Silva Henríquez, tentou-se um último acordo entre as duas principais lideranças civis do pais, o presidente Salvador Allende e o líder da Democracia Cristã, o senador Patrício Aylwin. Mas a esta altura era tarde. A classe média, o empresariado e os proprietários em geral, havia rompido com a UP, apostando suas esperanças num golpe salvador que contaria com irrestrito apoio dos E.U.A.. Reflexo disto era a aberta campanha feita pela imprensa, liderada pelo jornal El Mercurio (que inicialmente chegou a apoiar a UP) que exigia a imediata saída de Salvador Allende: “Renuncie! Hagalo por Chile”; sua manchete do dia 6 de setembro de 1973 dizia tudo.

Os militares atiçados por todos os lados finalmente puseram-se em marcha. O general Pinochet chegara ao comando supremo depois da renúncia do general oficialista Carlos Prats, um militar constitucionalista que se negou a participar de qualquer golpe (Prats foi assassinado pela DINA, a policia secreta pinochetista, uns anos depois no seu exílio em Buenos Aires).

Em poucas horas as Forças Armadas conseguiram submeter o governo da UP. Allende, resistindo só no palácio presidencial, era o retrato vivo do isolamento em que se encontrava o seu regime nos seus dias finais. Abandonado diplomaticamente pelo mundo ocidental, desprezado pelos governos militares seus vizinhos e impotente em deter as forças golpistas dentro do seu próprio pais, só lhe restou cair como mais um mártir da democracia: “Eu não resignarei” disse ele, “estou pronto para resistir sejam quais forem os recursos mesmo que custe a minha vida, isto servirá de lição nesta ignominiosa história destes que têm a força mas não a razão.”

A violência com que o golpe se deu deveu-se em grande parte à enorme tensão social porque o país passou depois ter sofrido por quase três anos de uma terrível pressão coletiva que, diga-se, começou antes mesmo da confirmação de Allende. Dois dias antes a sua posse, em 22 de outubro de 1970, o general René Schneider, então comandante supremo, foi assassinado para tumultuar a ascensão do socialista ao poder (a morte do general constitucionalista, considerado demasiadamente “neutro” pelos americanos, foi articulada pela CIA que forneceu as armas para um grupo de extrema-direita, chefiado pelo general da reserva Roberto Viaux).

Morto Allende, foi a vez das suas bases sofrerem o peso da repressão. Lideres sindicais, políticos, intelectuais, ativistas e militantes das diversas organizações esquerdistas, foram detidos e levados presos para o Estado Nacional de Santiago. Lá, depois de identificados, muitos foram sumariamente fuzilados, torturados ou mutilados pelos militares. Nas ruas das principais cidades os suspeitos, por vezes, eram passados pelas armas. A tortura rotinizou-se. A vida da população sofreu uma alteração brusca. Severos toques de recolher eram acompanhados de batidas policiais por quarteirões inteiros. A formação prussiana dos militares chilenos revelou sua eficiência e crueldade ao procederam com os caídos e os derrotados.

Não satisfeitos em liquidar com a oposição interna, o general Pinochet estimulou a execução da Operação Condor (com a colaboração dos militares, argentinos, uruguaios, bolivianos e paraguaios, com participação dos brasileiros limitadas à trocas de informações) que implicou na eliminação física dos seus adversários no exterior (além do General Carlos Prats, foi morto Orlando Letelier, um ex-embaixador chileno exilado em Washington D.C.). A violência da ditadura do general Pinochet (atribui-se a ela a morte ou o desaparecimento de 3.197 pessoas e mais um número incerto, mas bem maior de torturados) fez com que o seu nome fosse mundialmente associado ao terror estatal sem contemplação, a um fabricante de tormentos, tornado-se, como diria Pablo Neruda (morto no próprio dia do golpe), num dos “Bruxos da América”, os que “ matam os metais da ressurreição, fecham as portas e entrevam a morada das aves deslumbradoras”.

O Chile, que durante muito anos foi apontado como uma raridade na América do Sul devido a sua estabilidade política (os militares fizeram uma curta intervenção em 1924-5), passou a ser visto durante uns tempos como um vasto campo de concentração, bem longe do que Neruda dizia idilicamente do seu pais ser “uma longa pétala de mar, com vinho e neve”.

Os governos populistas na América Latina, estão marcados por diversas características em comum dentre elas gostaríamos de destacar : Políticas econômicas voltas para o incentivo da industrialização e substituição de importações; o desenvolvimento de ideologias nacionalistas que pregavam a união das diferentes classes sociais sobre a tutela do estado, tendo o líder muitas vezes sido confundido ou se fazendo confundir com o próprio estado e o antagonismo com aqueles que fossem contrários aos governos populistas; fenômeno urbano que se utiliza das massas para se apoiar; criação de políticas trabalhistas e controle de sindicatos pelo poder público possibilitava um maior controle sobre as massas trabalhadoras urbanas; práticas antiimperialista, como nacionalização de "setores estratégicos" para o país ( petróleo, estradas de ferro ...).
Após destacar alguns dos aspectos encontrados nos diferentes países que sofreram governos populistas, gostaríamos de trazer a baila, ou melhor, de tratar mais especificamente alguns aspectos do populismo na Argentina (J. Perón), México (Lázaro Cárdenas) e Brasil ( Getúlio Vargas), já que um assunto tão vasto foge das dimensões de uma analise  deste porte .
Lázaro Cárdenas no México e Perón na Argentina chegaram ao poder através de eleições. Já Getúlio Vargas chegou ao poder através do golpe de Estado que deu fim ao período da História brasileira, conhecido como republica velha.
Interessante que diferente da Argentina e do Brasil o populismo no México toma rumo diferente numa questão crucial chamada reforma agrária. O governo cárdenas foi o governo que mais distribuiu terras dentre o período de 1915 à 1962 .Sendo inclusive essa relação com o campesinato rural no México um dos grandes diferenciais dos outros governos populistas. Por que na Argentina e no Brasil o populismo se caracterizou eminentemente nos grandes centros urbanos e a reforma agrária não foi feita, pois os grandes Fazendeiros e Latifundiários continuaram a dominar o cenário rural nestes dois países .
Sendo o populismo um fenômeno arraigado no meio urbano e que busca o apoio nas crescentes massas trabalhadoras, cada governo toma diferentes atitudes, para tentar controlar essas massas populares.
No México com referência aos extratos urbanos o governo Cárdenas " mostrou-se progressista e não repressor. O Estado cardenista não reprimiu as greves nem outras manifestações operárias ou camponesas. ... O Estado, à época de Cárdenas, consolidou-se, burocratizou-se e se fortaleceu diante da sociedade como um todo ; os principais canais de participação política passaram a ser articulados à estrutura estatal, de forma particular o PRI, além dos sindicatos urbanos e rurais."
Já na Argentina o " peronismo se caracterizou também por uma política de concessões à classe operária; mas, ao lado das concessões, a postura autoritária repressiva do regime contra oposicionistas em geral. Além disso, a política posta em prática por Perón levou a um atrelamento dos sindicatos à burocracia estatal ... e, durante o regime peronista,- os sindicatos - são reconhecidos como uma mediação entre trabalhadores e poder político."
No governo Vargas, semelhante a Argentina o Estado intervém nos sindicatos e passa a legislar sobre as necessidades dos trabalhadores, além disso o governo Vargas ao intervir no sindicatos os torna dependente do poder público pois através do repasse de "contribuições" ( Impostos), dos trabalhadores para o sindicatos e tornando oficiais apenas os sindicatos que se alinhassem ao governo. Além disso a criação de uma legislação trabalhista como mostra Francisco Weffort, serve para controlar as massas de trabalhadoras. Pois ao controlar e administrar as demandas dos trabalhadores o governo passa a ter um poder de barganha junto a essas massas urbanas e de certa parte minar a influência de outros grupos, tais como os anarquistas e socialistas, que geralmente estavam presentes no meio dos movimentos urbanos trabalhistas.

E nas palavras do próprio Weffort ao comentar a legislação trabalhista e relação de troca surgida com a regulamentação das necessidades dos trabalhadores ele fala que " Vargas, apoiado no controle das funções políticas, "doa" às massas urbanas uma legislação trabalhista que começa a formular-se desde os primeiros anos do Governo Provisório e que se consolida no ano de 1943. A limitação da legislação aos setores urbanos não deve passar despercebida. São os setores que possuem maior capacidade de pressão sobre o Estado e aqueles que, desde antes de 1930, possuíam alguma tradição de luta; são também os setores disponíveis, para a manipulação política, pois apesar de que as regras de jogo eleitoral estivessem suspensas desde 1937 elas foram uma das primeiras conquistas da revolução de 1930 e continuavam a Ter uma existência virtual. Por outro lado, a restrição da legislação trabalhista às cidades atende às massas urbanas sem interferir com os interesses dos grandes proprietários de terra.."
Após analisar algumas das características do populismo no México, Argentina e Brasil, constatamos que o populismo no três países abordados têm alguns elementos em comum, mas dado a condições em que aconteça e o contexto histórico do País em que ocorra ele adquire características diferenciadas de um local para o outro.


Para fechar o assunto  não deixe de fazer o simulado abaixo.
Após resolver as questões você terá acesso ao gabarito comentado.
Obs: Quando começar a resolver as questões não interrompa par fazer outras coisas, pois o sistema pode interpretar que o aluno está procurando respostas (google) e você pode não conseguir gravar suas respostas ao final do exame.

http://araoalves.blogspot.com/2011/10/questoes-sobre-america-latina-no-seculo.html

 Um abraço e bons estudos!!!

Professor Arão Alves

Comentários

  1. O governo Kennedy na verdade se embarraçou com os resultados malograda em cuba, ele como presidente tentava criar uma nova imagem dos Estados Unidos , mas na verdade tentava empenhar o prestigio do governo kennedy em um vasto plano de reforma imperial que fosse usado na América Latina como alternativa social ao comunismo .((Selma))

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